Abelhas e flores jogam tabelinha com pólen

2012 
As interacoes entre flores e abelhas sao notorias e notaveis. As abelhas sao atraidas as flores pelos recursos que elas oferecem e inadvertidamente carregam o polen de uma flor a outra, promovendo polinizacao. As flores-de-polen ofertam apenas polen, As abelhas coletam o polen e o usam como principal fonte de proteina para suas larvas. No entanto, os graos de polen carregam os gametas masculinos das plantas indispensaveis para a polinizacao (!) Como sao ricos em nitrogenio, eles sao muito caros para as plantas. Alem do mais, o polen e um recurso nao renovavel; ou seja, uma vez coletado ele nao sera substituido e nao podera mais participar da reproducao da planta. Portanto, fica claro que flores-de-polen e abelhas competem pelos mesmos poucos graos de polen.Estas flores resolveram este conflito evolutivamente. A maioria delas esconde seu polen dentro de anteras poricidas (anteras com uma abertura parcial em forma de poro, geralmente apical). Para ter acesso ao polen, as abelhas agarram as anteras e vibram as flores com seus musculos indiretos de voo. Quando as vibracoes sao transmitidas para as flores, os graos dentro das anteras ganham energia cinetica, ate sairem pelos poros. Outra estrategia e a segregacao funcional entre anteras de uma mesma flor. Por exemplo, em flores de Cassia spp. (Caesalpiniaceae, Cassiinae), o androceu e formado por tres grupos de estames: tres estaminodios superiores, quatro estames curtos centrais e tres estames inferiores longos e com formato sigmoide. As abelhas coletoras de polen se concentram no grupo central de estames. O polen que sai dessas anteras esta ao alcance das pernas das abelhas, e e facilmente coletado por elas. Os tres estames longos e curvados seguem o comprimento das abelhas e alcancam seu dorso (bem como o pistilo com o estigma). As anteras depositam polen no dorso das abelhas, local onde o estigma toca. Alem disso, durante a autolimpeza, as pernas das abelhas nao alcancam todo o dorso, com o polen ficando a salvo, segurando-o para a polinizacao. Portanto, este “local seguro” no corpo das abelhas e essencial para a reproducao de Cassia spp. Esta divisao de trabalho entre anteras na mesma flor foi descoberta no Brasil (!) pelos irmaos Fritz e Hermann Muller, no inicio dos anos 1880. Muitas flores de Senna spp. (Caesalpiniaceae, Cassiinae) tambem possuem tres tipos de estames (algumas possuem ate cinco tipos): tres estaminodios superiores, quatro estames centrais curtos, mas ao contrario do que ocorre em Cassia spp., os tres estames inferiores tambem sao curtos e tem tamanhos similares aos dos estames centrais. Por causa disso, quando as abelhas pousam em cima deste complexo para retirar polen, todas as anteras ficam embaixo delas. O pistilo e consideravelmente mais longo do que o mais longo dos estames e toca o visitante no dorso, onde o polen fica depositado (!). Se os estames nao alcancam o dorso das abelhas, como os graos de polen chegam ate la? Alguns autores sugeriram anteriormente que a trajetoria dos graos de polen poderia ser influenciada por uma petala pronunciadamente concava de Senna spp., possivelmente atraves de ricochetes mutuos. No entanto, esta ideia ainda precisa de testes empiricos mais abrangentes.O objetivo deste trabalho foi estudar este mecanismo em flores de Senna spp. Nos conduzimos o estudo de campo no Crato - CE, de marco a junho de 2011. Usamos uma escova de dente eletrica comercial Philips Sonicare ® (Xtreme e3000; a’~ 516,67 Hz) como vibrador (abelha artificial). Os poros das anteras sao elevados por pequenas “chamines”. Quando estudamos as anteras individualmente, podemos observar que as vibracoes resultaram em jatos de polen.  Nossa flor de estudo possui uma petala bastante assimetrica com uma concavidade pronunciada. Desenrolada, ela mede 4 cm em media, por isso ela pode alcancar o dorso das abelhas. Tal concavidade confere a esta petala grande estabilidade, que ainda e aumentada por suas nervuras fortes e grossas. Para corroborar a hipotese de que a petala interfere na trajetoria dos graos de polen, vibramos as flores inteiramente para determinar o(s) local(is) para o(s) qual(is) os graos sao lancados. Dividimos o lado interno da petala concava em tres partes (base, meio e apice) e estudamos sua participacao no mecanismo. Durante as visitas, o apice desta petala se encosta Para visualizar o polen amarelo, aderimos fitas adesivas vermelhas a estas partes. Para reproduzir o mesmo fenomeno observado na natureza (polen chegando ao dorso das abelhas), posicionamos a escova (com fita adesiva vermelha em seu dorso) dentro de uma flor e a vibramos, imitando a posicao de uma abelha. Os graos de polen foram lancados principalmente em direcao a petala concava e atingiram sua base, centro e apice. Quando nos vibramos as flores experimentalmente, o polen imediatamente se depositou no dorso da escova. As quatro anteras centrais ejetaram polen principalmente para baixo, devido aos seus bicos curvados pra baixo. Na natureza, parte deste polen pode ser recebido diretamente pelas pernas medianas das abelhas. As tres anteras inferiores ejetam polen exclusivamente para a base e meio da petala concava. As duas anteras inferiores laterais tem seus bicos cruzados. Seus poros ficam na parte dorsal das anteras, lancando jatos de polen + horizontalmente para a petala  concava, passando por baixo das abelhas. Portanto, o polen que chega ao dorso das abelhas (bem como da escova) somente poderia faze-lo com a ajuda da petala concava, ja que todas as anteras ficam embaixo das abelhas. Nossos resultados dao suporte a hipotese de que a petala concava de fato interfere na trajetoria dos graos de polen. Nos demonstramos que em Senna sp., o conjunto central de anteras fornece principalmente polen como forrageio para as abelhas, enquanto que o grupo inferior de anteras e responsavel pelo polen no dorso das abelhas, destinado a polinizacao. Quando as flores sao vibradas, o polen das anteras inferiores e lancado em direcao a petala concava. Quando os graos colidem com esta petala, eles ricocheteiam em direcao ao apice (como bolas de bilhar) e finalmente chegam ate o dorso das abelhas. A energia cinetica nos graos de polen nao e suficiente para que eles completem seu circuito. Por isso, uma nova fonte de energia e necessaria. Como as vibracoes sao transmitidas para toda a flor, a petala concava em vibracao rebate os graos de polen, dando a eles o impulso que faltava. Neste caso, esta petala pode ser considerada uma extensao funcional das anteras. Ela, portanto, assume um papel na apresentacao secundaria de polen (2PP - do ingles secondary pollen presentation ). Como os graos passam rapidamente pelas petalas, chamamos esta apresentacao secundaria de virtual. Nas flores-de-polen de Senna spp., ha uma notavel divisao de trabalho diferenciando efetivamente o polen para polinizacao daquele para forrageamento. Embora as abelhas pousem em cima do conjunto de todas as anteras de tamanhos semelhantes, a maior parte do polen chega ate ao seu dorso, onde esta a salvo das abelhas e sera transportado para estigmas de outras flores. O polen chega la atraves de ricochetes mutuos ao longo de uma petala concava. Esta petala de ricochete funciona como uma extensao das anteras quando as abelhas vibram as flores. Este mecanismo garante que a maioria do polen fique depositado no dorso das abelhas, destinado a polinizacao. Como as abelhas conseguem poucos graos de polen por flor, elas precisam visitar muitas flores para coletar polen suficiente para nutrir suas larvas.
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