A FUNÇÃO DO GLUTAMATO NOS TRANSTORNOS DE ANSIEDADE E NO TRANSTORNO OBSESSIVO-COMPULSIVO

2021 
Segundo o DSM-5, entre os transtornos de ansiedade mais estudados, ganham destaque o transtorno de ansiedade generalizada (TAG), o transtorno do pânico (TP) e o transtorno de ansiedade social (TAS). Entre os principais neurotransmissores relacionados a fisiopatologia desses transtornos estao a serotonina, a dopamina e o glutamato. O glutamato e o principal neurotransmissor excitatorio do sistema nervoso central (SNC) e tambem tem uma relacao importante na fisiopatologia do transtorno obsessivo-compulsivo (TOC). Devido a relevante funcao da neurotransmissao glutamatergica nos transtornos ansiosos e no TOC, este estudo objetivou analisar os estudos da literatura cientifica sobre os circuitos neuronais envolvidos, a relacao do glutamato com outros neurotransmissores, o circuito cortico-estriado-talamo-cortical (CETC), alem da relacao com o eixo hipotalâmico-pituitario-adrenal (HPA). Realizou-se uma extensa revisao da literatura na base de dados Pubmed dirigida a buscar a acao do glutamato nos diversos circuitos envolvidos com TAG, TP, TAS e TOC para a posterior escrita detalhada de um capitulo completo publicado em livro internacional. A exposicao prolongada e frequente a eventos estressores externos desencadeia uma resposta fisiologica e comportamental, que cronicamente acarreta em mudancas funcionais persistentes, devido a ativacao do HPA e consequente liberacao constante de cortisol. As vias glutamatergicas presentes no cortex pre-frontal sofrem influencia do estresse e desregulam a neurotransmissao em areas referentes ao afeto e a cognicao. Outro estudo mostrou que o antagonismo glutamatergico parece desempenhar um papel importante no bloqueio dos sistemas hiperativos do eixo HPA em transtornos neuropsiquiatricos. Em relacao a TAG, os estudos sugerem que os deficits de acido gama-aminobutirico (GABA) associados ao aumento da neurotransmissao excitatoria do glutamato sao mecanismos envolvidos na patogenese desse transtorno. Por exemplo, alguns estudos realizados por ressonância magnetica funcional (fMRI) analisaram as respostas cerebrais em TAG diante de estimulos emocionais negativos e observaram aumento da estimulacao de estruturas limbicas, como a amigdala, regiao relevante no controle do medo e da reatividade emocional, e a insula, responsavel pelos estados fisiologicos internos envolvidos com as emocoes. Ainda, atraves da neuroimagem detectou-se a inadequacao adaptativa do cortex pre-frontal (CPF) medial diante de estimulos desencadeados pela preocupacao rigorosa e persistente. Visto isso, a literatura cientifica fornece evidencias de que o glutamato e o neurotransmissor primario nas conexoes bidirecionais entre o CPF e a amigdala, sendo este circuito responsavel pela regulacao das saidas da amigdala ao hipotalamo e a ativacao de respostas fisiologicas a ansiedade. Ja o TP apresenta um mecanismo importante de ativacao inadequada da rede central de medo, a qual inclui a amigdala e suas conexoes com o hipocampo, talamo, hipotalamo, materia cinzenta periaquedutal, locus coeruleus e CPF. A conexao com o CPF gera uma interpretacao inadequada das informacoes sensoriais e dos processos de condicionamento, resultando em ataques de pânico e na ansiedade antecipatoria. Tambem foi observado que a regiao dorsomedial do hipotalamo e um dos locais que coordenam respostas neuroendocrinas, autonomas e comportamentais, sendo que o aumento do glutamato nessa regiao, em um experimento com ratos, desencadeou sintomas cardiorrespiratorios como taquipneia, taquicardia, hipertensao e evasao na interacao social, os quais estao presentes em pacientes com TP. Em relacao ao TAS, um estudo observou que o bloqueio do receptor de glutamato NMDA no nucleo reticular pontino caudal atenuou o medo. Em concordância, outro estudo demonstrou que a infusao de cetamina, um antagonista do receptor NMDA, promoveu uma resposta ansiolitica em individuos TAS. Quanto ao TOC, existem inumeras hipoteses etiologicas que apontam para heterogeneidade de circuitos envolvendo o cortex frontal, nucleos basais, talamo e outras regioes do sistema limbico, que ao nao processarem as informacoes de forma equilibrada, desencadeiam sintomas especificos. A neurotransmissao glutamatergica e um dos mecanismos criticos e as evidencias apontam para niveis de glutamato elevados no liquido cefalorraquidiano em individuos com TOC. As evidencias tambem apontam que os neuronios glutamatergicos originarios no cortex pre-frontal desempenham um papel fundamental no circuito CETS. A repetida estimulacao glutamatergica interfere nos mecanismos de plasticidade em estruturas do circuito, como o talamo e o estriado. O aumento da atividade glutamatergica, especialmente do receptor NMDA e um potente mecanismo de excitotoxicidade neuronal e tambem pode interferir na funcao de outros neurotransmissores envolvidos com os transtornos de ansiedade e TOC.  As evidencias de que a hiperatividade glutamatergica esta relacionada aos transtornos de ansiedade e ao TOC sao compativeis com as pesquisas tanto em pacientes quanto em modelos animais que apontam, por exemplo, para o efeito ansiolitico do riluzole, um inibidor da liberacao de glutamato. Dessa forma, a reducao da transmissao glutamatergica em alguns circuitos neuronais apresenta-se com um futuro promissor em conjunto com os demais agentes terapeuticos, como os que modulam a neurotransmissao dopaminergica serotoninergica, no tratamento dos transtornos de ansiedade e TOC.
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