Um século de caça comercial na Amazônia
2015
A Amazonia e uma das ultimas fronteiras aonde ainda sao possiveis a conservacao e o uso
sustentavel da fauna silvestre. Nosso conhecimento sobre os fatores que determinam a resiliencia
das especies cinegeticas a caca advem principalmente de estudos pontuais, seja no espaco, como no
tempo. Utilizando de um vasto acervo documental inedito sobre o comercio de peles na Amazonia
centro-ocidental brasileira, realizamos o primeiro estudo cobrindo ampla escala temporal e regional,
e elucidamos, em tres capitulos, diversas lacunas do conhecimento acerca desse episodio da
ecologia historica Amazonica. No primeiro capitulo, publicado no Boletim do Museu Paraense
Emilio Goeldi (Ciencias Humanas) em 2014, descrevemos, como importantes eventos politicoeconomicos
mundiais influenciaram o comportamento da demanda por peles silvestres na
Amazonia. Esse comercio aumentou sua escala logo apos ao colapso do preco da borracha (1912),
atingiu um pico entre meados da decada de 1930 e a Segunda Guerra Mundial, declinou levemente
apos o termino do conflito, e voltou a crescer durante as decadas de 1960-1970, ate as publicacoes
da Lei da Fauna (1967) e da CITES em 1975, que em teoria deveriam extinguir o comercio, mas
que se manteve enquanto houve demanda internacional. Descrevemos ainda que o comercio de
peles esteve totalmente inserido no modelo economico regional denominado de aviamento. Uma
vez conhecidas as tendencias gerais do comercio de peles na Amazonia, analisamos, no segundo
capitulo, series temporais de 66 anos para 10 especies-alvo usando regressoes spline, com o
objetivo de verificar a resiliencia das especies. Mais do que parâmetros ecologicos padroes na
predicao da resiliencia, como, por exemplo, a taxa intrinseca de crescimento populacional (rmax), o
acesso as areas de caca parece ter sido o principal fator da resiliencia das especies a caca comercial
ao longo do seculo XX. A menor area relativa dos ambientes aquaticos e o acesso facilitado
parecem ter determinado o colapso das populacoes de especies aquaticas e semi-aquaticas na bacia Amazonica, enquanto que o acesso limitado aos ambientes terrestres deve ter mantido extensos
refugios para a fauna. No terceiro capitulo, usamos registros comerciais da producao de peles
silvestres de queixada, caititu e veado-vermelho nas decadas de 1930-1940, em todos os 34
municipios historicos da Amazonia centro-ocidental brasileira. Apos a producao ser padronizada
pelo numero de habitantes nas zonas rurais, como uma forma de controlar diferencas no esforco de
caca, torna-se evidente o gradiente leste-oeste na abundância de tres especies de ungulados nesse
regiao. Esse padrao espacial encontra-se mais correlacionado com a fertilidade do solo nesses
municipios do que com a fatores climaticos, como pluviosidade anual ou coeficiente de
sazonalidade. No entanto, a intensidade de caca ultrapassa o efeito da fertilidade do solo na
predicao da resiliencia das especies mais vulneraveis a caca comercial, como o queixada. A
relevância dos nossos resultados demonstra a importância da ecologia historica recente para o
debate sobre a influencia humana preterita na Amazonia, alem de incrementar tanto nosso
entendimento sobre a variavel capacidade de explotacao dos recursos naturais na Amazonia, como
nossas ferramentas na aplicacao de acoes para a conservacao e manejo da biodiversidade.
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