Programa de Educação pelo Trabalho (PET): relato de uma experiência a favor da educação permanente.

2012 
O Instituto de Psiquiatria e a Escola de Servico Social da UFRJ participam de um Programa de Ensino pelo Trabalho chamado PET Saude, Saude Mental Crack, Alcool e Drogas, uma iniciativa conjunta entre os Ministerios da Saude e da Educacao, que inseriu, desde marco de 2011, graduandos da area da saude e tutores (docentes) em servicos publicos de saude mental da capital do RJ (CAPS - Centro de Atencao Psicossocial), contando com a preceptoria de tecnicos dos servicos. A metodologia do trabalho, que relata apenas a experiencia de um dos grupos de tutoria, estruturou-se em dois momentos articulados: um de imersao no cotidiano dos servicos e outro na universidade. O primeiro foi constituido de um trabalho junto com a equipe no servico, um de supervisao tecnica com preceptor e outro de reuniao de equipe (encontro semanal de discussao, deliberacao e encaminhos realizada pela equipe tecnica). O segundo momento proporcionou a interlocucao entre os tutores, preceptores e graduandos, sendo dividido em um espaco de reuniao semanal entre graduandos e tutores, quinzenal entre tutores, preceptores e graduandos, uma reuniao geral mensal com todos os grupos de tutoria e uma reuniao mensal somente entre preceptores e tutores. Esses encontros favoreceram a imersao dos graduandos no servico e a circulacao de impressoes e conhecimentos tanto no interior do servico como no espaco da universidade, implicando em “aprendizado real”. Para tal pratica, foi adotada uma estrategia de pesquisa que movimentasse e orientasse esses encontros. A estrategia escolhida foi a chamada “caso tracador” que, segundo Feuerwerker e Merhy (2011), e muito utilizada na analise de processos complexos como das areas da Educacao e Saude, e permite conhecer e aprender “em ato”. Essa estrategia consiste na analise da trajetoria de um usuario especifico atraves da rede de cuidados singular que ele construiu ao redor de si, sendo importante, pois proporciona a captacao de valores, conceitos e tecnologias que nao seriam passiveis de serem escutados em uma simples entrevista, onde “geralmente se fala do “dever ser” – e nao do que realmente e – ou de como cada um interpreta a cena vivida – sem expressar necessariamente os conflitos”. A adocao dessa experiencia, que nao foi perdida de vista durante todos os momentos do projeto, trouxe a tona a singularidade e a complexidade dos casos da clinica ao mesmo tempo em que produziu conhecimento sobre a potencia e dificuldades da rede. Optou-se pela escolha de dois casos principais, um do CAPSad Raul Seixas e outro do CAPS II Torquato Neto, da mesma area programatica do Municipio do Rio de Janeiro, que receberam uma atencao especial, mas a ideia de caso tracador ficou presente no cotidiano do projeto na forma como tentavamos aprender com os aspectos singulares de cada caso. A reflexao sobre esses dois casos gerou um conhecimento vivo sobre os nexos e rupturas entre o trabalho das diversas politicas sociais, do CAPS e da comunidade no territorio, sendo observado que quando a rede singular de cuidados esta sendo tecida com o reconhecimento da comunidade em relacao a rede SUS, facilita-se o processo de reabilitacao. Porem, alem da relevância desse conhecimento, e importante ressaltar a forma atraves da qual se chegou a ele, ou seja, a importância da educacao imersa na realidade dos servicos. Segundo Massaroli e Saupe (2005), em 1978 a organizacao pan-americana de saude usou o termo Educacao Continuada para designar o “processo permanente que se inicia apos a formacao basica e tem como intuito atualizar e melhorar a capacidade de uma pessoa ou grupo, frente a evolucao tecnico-cientifica e as necessidades sociais”. Mas, segundo os mesmos autores, inspirado no conceito freireano de “competencia processual” vai surgindo um novo termo: “educacao permanente”, com um sentido mais amplo que abarca a experiencia coletiva alem da individual e se da orientada para “enriquecer a essencia humana e suas subjetividades, em qualquer etapa da existencia de todos os seres humanos e nao somente de trabalhadores”. Hoje seria possivel falar de “Educacao Permanente em Saude”, conceito que vem tomando forca de politica publica e que abrigaria, “alem da educacao em servico, a compreensao no âmbito da formacao tecnica, de graduacao e de pos-graduacao; da organizacao do trabalho; da interacao com as redes de gestao e de servicos de saude; e do controle social no setor” (Massaroli & Saupe, 2005) Segundo Massaroli e Saupe (2005), pode-se dizer que a Educacao Permanente em Saude articularia processos que atentariam ao estatuto essencialmente mutante da realidade do servico em questao, e estaria em conexao com a politica de formacao dos profissionais da area e com a rotina dos servicos com o objetivo de melhorar nao so as praticas que devem ser interinstitucionais e intersetoriais como a propria organizacao, promovendo a problematizacao dos processos que devem emergir do interior das equipes, contemplando a atualizacao tecnocientifica, porem com foco na formacao integral do ser humano. Logo, a Educacao Permanente seria um aparelho integrado a estrutura da organizacao que a partir das experiencias vividas no cotidiano do servico seria capaz de formular estrategias para ajudar na solucao dos problemas. Entao, este trabalho refere ao encontro entre Educacao Tutorial, via PET, e Educacao Permanente, no qual, varios efeitos foram alcancados e relatados pelos graduandos tais como: a problematizacao de preconceitos em relacao aos usuarios de drogas e ao usuario de saude mental; o entendimento da importância de uma forma de cuidado integral e humanizada que envolva a construcao de uma rede de cuidado individualizada e que considere o desejo do usuario; o exercicio inter e transdisciplinar na equipe, fundamental para a construcao do tratamento e do projeto terapeutico dos pacientes; a constituicao de pesquisa dentro do servico, revelando dificuldades da clinica AD e o entendimento da importância de atentar para a ideologia e conjuntura politica, que favorecem ou nao determinados modos de produzir saude. Sendo assim, essa experiencia de formacao para o SUS, distinta da “educacao bancaria” como denunciou Paulo Freire (2000), foi o principal efeito alcancando pelo PET, uma vez que, os encontros proporcionaram, nao so um enriquecimento academico e curricular, mas tambem foi uma experiencia muito exitosa, que influenciou na formacao cientifica, profissional e social de cada integrante, resultando na producao de mais autonomia e criatividade entre os graduandos e profissionais na busca do ideal de uma educacao permanente tao recomendavel para quem se propoe a enfrentar os desafios cotidianos da area de saude mental.
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