Historia natural, demografia, viabilidade populacional e conservacaode Asthenes luizae (Furnariidae), ave endemica dos campos rupestresda Cadeia do Espinhaco, Minas Gerais

2015 
Este estudo teve como principal objetivo contribuir para a conservacao e o entendimento da historia natural e ecologia de Asthenes luizae (Furnariidae), uma ave pouco conhecida e restrita aos afloramentos rochosos dos campos rupestres da Cadeia do Espinhaco em Minas Gerais, Brasil. Para tal, monitorou-se uma populacao na Serra do Cipo ao longo de seis anos, investigando os habitos de nidificacao, sucesso reprodutivo e demografia, com enfase nos impacto de uma das ameacas mais apontadas para a especie: o nidoparasitismo pelo icterideo Molothrus bonariensis. Os habitos de nidificacao foram comparativamente analisados com o de especies aparentadas de Synallaxini, investigando-se a historia evolutiva de aspectos dos ninhos. As informacoes disponiveis de sua historia de vida e ecologia foram utilizadas para realizar uma Analise de Viabilidade Populacional(AVP), inferindo sobre o risco de extincao e avaliando o grau de ameaca da especie de acordo com os criterios da IUCN. Os principais resultados relacionados a nidificacao foram: seus ninhos (n =81) fechados nao apresentam tuneis ou tubos na entrada lateral; sao compostos predominantemente por gravetos, mas tambem por outros materiais de origem vegetal, mineral e animal, sendo possiveldistinguir tres camadas de acordo com a composicao; a forracao interna cobre todo o interior do ninho; e os locais de nidificacao nao se restringem a canela-de-ema Vellozia nivea (Velloziaceae)como se supunha anteriormente. Registrou-se uma ampla variedade de locais de nidificacao, situados a baixa altura (media = 33,4 cm), a maioria (95%) em plantas de distintas arquiteturas (ao menos 29 especies; 82% endemicas do Espinhaco), mas tambem sobre rochas. A composicao de gravetos e predominante no clado Synallaxini, mas nao em Asthenes, supondo-se que sejam o estado ancestral deste ultimo. Enquanto tuneis ocorrem na maioria dos ninhos de gravetos, nao haevidencia confirmada de que tubos ocorram em Asthenes, estando aparentemente restritos ao clado contendo o genero recem-separado Pseudasthenes e parentes proximos. Os diversos componentesdo sucesso reprodutivo foram baixos, sendo o sucesso de ninhos (10%) um dos menores dentre Passeriformes neotropicais. Perdas parciais de ovos e ninhegos tambem contribuiram com baixas taxas de produtividade (0,12 filhotes/ninho; 1,22 filhotes/ninho bem-sucedido) e fecundidade (c. 0,58 filhotes/femea). A principal causa de insucesso de ninhos foi o nidoparasitismo por M. bonariensis (56% dos fracassos), que ocorreu com elevada frequencia (60%) e intensidade (2,9parasitas/ninho). Uma vez parasitado, a chance do ninho produzir um filhote legitimo e nula. A predacao foi a segunda causa de insucesso de ninhos para A. luizae (33% dos fracassos), mas o principal empecilho em produzir filhotes legitimos ou parasitas (86% dos fracassos totais). Aeliminacao hipotetica do parasitismo indicou que poderiam ser quase duplicados o sucesso de ninhos (18%), a produtividade (0,22 filhotes/ninho) e a fecundidade (c. 0,98 filhotes/femea). A estacao reprodutiva foi extremamente longa, ocupando 67% do ano, o que pode ser um dos escapes do nidoparasitismo pela especie. O monitoramento de individuos marcados (n = 37) e de territorios viii (n = 22) revelou um forte declinio populacional entre 2009 e 2015. Desde o inicio do estudo houve escassez de femeas, refletida no desvio da razao sexual (M:F = 2,7) e baixa proporcao de individuos pareados (47%). A sobrevivencia anual de adultos foi relativamente alta (72%), mas a de femeasadultas (46%) e a de jovens (29%) foram baixas, embora estimadas com maior incerteza. Trocas de territorios foram raras, sugerindo baixas taxas de migracoes. O aumento no numero de territorios vagos (ate 61%) indica que houve baixo recrutamento por natalidade ou imigracao. A densidade media de adultos foi 0,08 individuos/ha de area de estudo e 0,17 individuos/ha de afloramentos rochosos, mas a densidade de individuos maduros (pareados) foi bastante menor (0,03 e 0,07,respectivamente). O tamanho populacional global da especie foi projetado em c. de 21.800 individuos maduros, distribuidos desigualmente entre os tres principais blocos de montanhas doEspinhaco mineiro (700 no norte, 1.900 no central e 19.800 no sul). A AVP projetou altissimas probabilidades de extincao para a populacao no Parque Nacional da Serra do Cipo, indicando que essas sao inviaveis ao longo de 100 anos se mantidas as condicoes atuais (tempo para extincao = 11- 31 anos), mesmo sob modelos mais otimistas. Cenarios alternativos indicaram que a eliminacao dos efeitos da depressao endogamica nao causou impactos significativos, enquanto a eliminacao dos efeitos do nidoparasitismo elevou a taxas de crescimento populacional em 12-50% e adiou a extincao em 2-31 anos. Contudo, nao garantiu a viabilidade da populacao. Analises de perturbacaodemograficas (elasticidade e sensibilidade) indicaram que a mortalidade de femeas adultas foi o parametro cuja variacao e capaz de causar maiores alteracoes na taxa de crescimento e no tempomedio para extincao. No entanto, dentre os niveis de perturbacao avaliados, somente a reducao de 50% na mortalidade de jovens sob o modelo otimista produziria populacoes viaveis. Populacoesequivalentes a populacao global tambem foram inviaveis, extinguindo-se em media em 18-54 anos. No entanto, seriam viaveis sob o modelo otimista na ausencia do nidoparasitismo. O risco de extincao foi alto o suficiente para que A. luizae seja considerada, no minimo, como Vulneravel pelo criterio E da IUCN. Dada a incerteza da eficiencia e a complexidade de um controle direto de M. bonariensis, sugere-se como possivel estrategia de manejo o controle de impactos antropicosprovenientes de queimadas e criacao de gado, que tem o potencial de favorecer a sobrevivencia e a reproducao de A. luizae, alem de controlar indiretamente o nidoparasitismo.
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